Alguns operadores do direito entendem que, com o ajuizamento da demanda judicial, por conta do direito fundamental do acesso à Justiça, mesmo naqueles casos em que não houve aviso de sinistro prévio ou esgotamento da esfera administrativa, não poderiam promover a regulação do sinistro em paralelo junto a área técnica da companhia.

Porém, isso não é um empecilho para que se trace essa linha paralela, ainda mais se toda a documentação necessária a regulação administrativa tenha sido apresentada no início ou no decorrer do processo judicial.

A alegação de falta de interesse de agir pela ausência de pretensão resistida se mostra enfraquecida quando a seguradora não demonstra o interesse em promover medidas de solução do conflito, se limitando apenas a contestar uma demanda pelo fato de que não houve aviso, desconsiderando que, por vezes, o sinistro restou caracterizado, implicando apenas num prolongamento da duração do processo e custos judiciais. É o que nos mostra grande parte da jurisprudência nacional.

Pelo contrário, se é feita a regulação administrativa no curso do processo, além de não restar demonstrada a recusa/resistência da seguradora, demonstra claramente o fato de que a demanda poderia ter sido solucionada pelas vias administrativas.

Ok…poderia ser o caso de recusa, mas a apresentação da carta negativa e a informação de que houve uma regulação em paralelo, demonstra a adoção de meio extrajudicial para tentativa de solução do conflito e fortalece a argumentação apresentada em contestação na esfera judicial. Sim, o processo continuará tramitando, porém, com mais fundamento e instrução.

Entretanto, não são todos os casos que levariam a uma recusa da seguradora e, exatamente nessas hipóteses, é que a seguradora precisa ser proativa e providenciar a regulação interna, a fim de solucionar o problema do consumidor, o qual pode ter sido mal instruído ou tido dificuldade na promoção do aviso de sinistro e envio de documentação.

A proteção dos interesses dos consumidores não deve ficar a cargo apenas do Poder Judiciário, mas também das empresas, que precisam atender os seus clientes da melhor forma possível, mesmo quando estes ingressam com processos judiciais desnecessários.

Nesses casos, a área de sinistro concluindo pela cobertura do sinistro, além de uma tentativa de acordo, a qual pode se mostrar infrutífera, como sabemos, pela questão de honorários sucumbenciais e pretensão de dano moral, precisa ser cumprida. Não se trata de um reconhecimento do pedido de forma pura e simples, mas de uma demonstração de que aquela demanda não era necessária e que o Judiciário foi acionado de forma desnecessária.

Aliás, mesmo que fosse hipótese de reconhecimento do pedido, como seria o caso, por exemplo, de uma regulação administrativa equivocada e que não levou em conta todos os fatores do evento avisado (temos que ter em mente que erros existem e a área de sinistro “pode ter comido bola”), o Código de Processo Civil, em seu artigo 90, § 4º, prevê que os honorários e as despesas processuais serão reduzidas pela metade, o que já demonstra uma economia para a companhia.

Tendo a parte acionado o Poder Judiciário sem aviso prévio junto a seguradora, bem como uma resistência por esta na realização do acordo, a seguradora comunica o fato de que não irá se insurgir quanto ao pagamento do capital segurado e/ou cumprimento de obrigação de fazer, apenas mantendo a discussão quanto a falta de interesse de agir, a qual, com essa postura de cumprimento do contrato de seguro, se mostrará muito mais fortalecida e justificada.

Alguns tribunais estaduais, diante dessa postura da seguradora, tem extinguido a demanda sem resolução do mérito por perda do objeto e ainda condenado a parte autora no pagamento de honorários sucumbenciais, pois teria dado causa, desnecessariamente, ao ajuizamento da demanda ao não acionar administrativamente a seguradora. Outros fundamentam na falta de interesse de agir.

Poderia se dizer que grande parte da jurisprudência brasileira não reconhece a necessidade de esgotamento ou acionamento das vias administrativas como pressuposto processual, mas isso se deve ao fato de que boa parte das defesas apresentadas pelas seguradoras se limita, simplesmente, em arguir a falta de interesse de agir, sem demonstrar clara e objetivamente que, se avisado o sinistro, teria realizado o pagamento da importância segurada ou cumprido com eventual obrigação contratual.

É preciso ter em mente o afogamento do Poder Judiciário com demandas consumeristas e a necessidade de uma postura mais proativa da seguradora para solucionar rapidamente esses processos desnecessários, nesse sentido é a plataforma consumidor.gov.br e alguns projetos de lei prevendo, em caso de direitos patrimoniais disponíveis, como é o caso do seguro, da demonstração de resistência do réu (veja, por exemplo, o Projeto de Lei 533/2019, em trâmite na Câmara dos Deputados).

O escritório Carvalho Nishida, tendo em conta a relevância dessa questão e a possibilidade de redução de prejuízos da companhia, assim como o seu impacto na provisão, está sempre atento a essas mudanças legislativas e as posturas adotadas pelos tribunais.