O Mercado Segurador tem vivenciado um momento único. Um movimento de avanço, revisão e melhoria de produtos e institutos, no sentido de torná-los mais claros, de fácil compreensão, voltando os olhos ao segurado e, usando a linguagem bastante propagada pelas empresas de tecnologia que igualmente têm agregado valor e mobilizado esta alavanca do mercado, há uma preocupação como nunca se teve com a “jornada do segurado”. 

E a preocupação com esta jornada, diferente do que muitos pensam, não tem início com a contratação – por meio de elementos tecnológicos de facilitação da aquisição, vem antes disso, com a facilitação da linguagem e compreensão de todos os institutos envoltos no universo securitário. 

Prova disso são todos as minutas em pauta para consulta pública pela Susep – Superintendência de Seguro Privado, que vem nesta toada de reciclagem de todo o universo, de forma absolutamente saudável e a fomentar não só o bem-vindo desenvolvimento do setor, mas também e principalmente, lapidando, revigorando normativos e conceitos, de modo a adaptá-los à cena atual (tecnológica, agregadora e desenvolvimentista), escancarando a intenção de melhoria ao Segurado, acima de tudo. 

Uma delas seria a minuta de Resolução CNSP (sobre estipulação de seguros e responsabilidades e obrigações de estipulantes e sociedades seguradoras em contratações de seguros por meio de apólices coletivas), recentemente posta em discussão na consulta pública 35/2021, que tem por escopo a revisão da Resolução CNSP nº 107/2004, em cuja exposição de motivos1 para apresentar proposta de análise no que se refere às normas que regulamentam a figura do estipulante de seguros, percebe-se claramente essa preocupação. 

Já não era sem tempo de identificar e providenciar esse revigoramento e sobre ele jogar luzes e abrir o debate, na medida em que, como dito na própria exposição de motivos mencionada, “o estipulante é uma figura de grande importância na relação contratual. Sua atuação não se esgota com a conclusão do contrato coletivo, pois exerce funções típicas de mandatário dos segurados e de administrador da apólice, além de ser o efetivo contratante do seguro”. 

E o tema toma, ainda, contornos mais significativos quando olhamos para a leitura jurisdicional, jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça sobre a figura do estipulante, para quem “o estipulante é, portanto, figura indispensável. É ele quem contata a seguradora, negocia e contrata o seguro coletivo com o objetivo de, só depois disso, oferecer o produto à adesão do grupo de pessoas a ele vinculadas”. 

E isso, na visão do STJ, coloca nas mãos do estipulante toda responsabilidade pelo dever de informar sobre cláusulas do seguro de vida em grupo, perante os indivíduos do grupo segurado. 

Esse posicionamento, que pode se dizer recente (publicado em agosto de 2021), quando do julgamento dos EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 1825716 – SC (2019/0200554-1), em que foi Relator o Ministro Antonio Carlos Ferreira, proveniente da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, concluiu que não é possível impor à seguradora a responsabilidade pela falha no dever de informar que determinada cobertura está expressamente excluída no contrato firmado, e com isso pacificando o tema, uma vez que se aliou ao idêntico entendimento já trazido pela 3ª Turma em fevereiro de 2021. 

No entanto, é importante salientar que a decisão da 4ª Turma não foi unânime, já que contou com duas divergências, dos Ministros Raul Araújo e Marcos Buzzi, vislumbram sim a responsabilização pelo dever de informar podendo ser imputada à Seguradora, pois a existência da figura do estipulante não afasta dever e obrigações enquanto fornecedora, nos moldes estabelecidos pelo Código de Defesa do Consumidor. 

 

E não é só. Na visão dissidente minoritária de ambos os Ministros, há ainda um viés econômico, no posicionamento majoritário, que merece reflexão, segundo o qual, no entendimento dos Ministros, pode enfraquecer o segmento, no sentido de desencorajar a estipulação, com notório déficit econômico para o segmento. 

 

Enfim, o tema é palpitante, com reflexos para além da tríade Segurado – Estipulante – Segurador, e merece e vem recebendo, atenção e debate, proporcionado pelo Órgão Regulador, envolvendo a sociedade, fator fundamental, via consulta pública. 

 

Certo que a comunidade jurídica que manobra o tema no judiciário tem ainda o dever de esticar o olhar também para a jurisprudência, pois como demonstrado, sem dúvida alguma, é componente que interfere nas relações negociais e econômicas do segmento. 

 

Esse olhar interdisciplinar faz parte da genética do Carvalho Nishida, preocupado e atento aos movimentos do Mercado Segurador e todos seus reflexos no dia-dia-dia do negócio.