Vivemos uma realidade de transformação digital, assim, muitas seguradoras e insurtechs vem anunciando contratação e experiência “100% digital” ao público em geral.

A Circular Susep 277/2004[1], já autorizava a utilização de assinatura digital nos documentos eletrônicos relativos as operações de seguros. Assim, firmar eletronicamente a contratação já era uma alternativa e não seria uma novidade propriamente dita, mas o mercado de seguros vinha se utilizando de maneira tímida e com um certo receio essa possibilidade.

Quanto a isso, os requisitos e os elementos contratuais continuam os mesmos (art. 104, do CC), o que muda é apenas o seu formato. A versão em papel é deixada de lado e a versão eletrônica passa a ganhar relevância. Em outras palavras, a contratação digital não gera novas obrigações, diversas daquelas da contratação tradicional. Em contraposição, garante mais agilidade, inclusive com mais segurança, visto que deve ocorrer em um ambiente extremamente seguro, com uso de criptografia e códigos, a fim de evitar risco de fraudes.

Assim, com a mudança do público-alvo (buscando acessibilidade e praticidade no dia a dia) e, principalmente, com as limitações e impactos gerados com a pandemia, houve uma necessidade de aceleração na transformação digital no mercado de seguros, especialmente no que se refere a experiência do cliente e a contratação digital.

Até mesmo as vistorias, setor mais apegado ao formato presencial, passaram a admitir a possibilidade de vistorias remotas, seja por aplicativos, videochamadas ou fotos, a fim de garantir uma experiência “100% online” do cliente.

Quanto a essas ferramentas disruptivas, as insurtechs tiveram um grande papel como pioneiras no mercado de seguros, mas as grandes seguradoras também não ficaram atrás, buscando empreender cada vez mais nesse universo digital e se utilizar de ferramentas amplamente utilizadas no meio bancário e no E-commerce.

A exemplo do que já tínhamos no ambiente bancário e do passo a passo ali adotado, a contratação eletrônica de seguros passou a ocorrer por meio de “clique único” em caixas eletrônicos, adesões em sítios eletrônicos ou aplicativos de corretoras/operadoras de seguros, em que, após a manifestação com o “de acordo” do segurado sobre as condições gerais e os riscos escolhidos, é exigida a digitação de senha do segurado, o uso de geolocalização e/ou de biometria facial.

Ambiente de extrema segurança, com criptografia e uso de assinatura eletrônica pessoal e intransferível, garantem que a contratação de seguro por meio eletrônico só aconteça por manifestação expressa do cliente. Sobre esses requisitos de segurança, autenticidade e uso de

meios eletrônicos, a Resolução CNSP 294/2013[2], já dispunha de algumas regras a serem observadas pelo mercado de seguros, as quais foram substituídas com a sua revogação pela recente Resolução CNSP 408/2021[3].

Porém, o uso dessas ferramentas virtuais, automação nos atendimentos e uso de tecnologias para análise de dados, além de promover uma transformação no mercado de seguros, traz a necessidade de alguns cuidados muito importantes para evitar a ocorrência de fraudes e utilização indevida de dados dos consumidores.

Nesse ponto, importantíssimo que se garanta nesses meios digitais a disponibilidade de informações completas ao consumidor, a fim de que este tenha ciência do que está sendo contratado, os limites das coberturas e, no caso das corretoras ou operadoras, a seguradora garantidora. Sobre isso, a recentíssima Circular Susep 642/2021[4], dentre outros pontos, contém os elementos essenciais constantes na proposta, seja ela por meio físico ou digital.

E mais, nessa contratação digital, o preenchimento e a formalização precisam ser feitos de forma autenticada e passível de comprovação da autoria e integridade, sob pena da empresa assumir os riscos dessa contratação indevida e dos prejuízos daí resultantes.

Sobre essa temática da contratação de seguros por meios digitais, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 9409/2017[5], que “dispõe sobre a realização de propostas, endossos, aditivos, certificados individuais, bilhetes, apólices e contratação de seguros privados, de microsseguros e de planos de previdência complementar aberta, por intermédio de transações eletrônicas seguras”, apresentando requisitos cumulativos para tanto.

Nós, da Carvalho Nishida, acompanhamos essas mudanças e sabemos dos riscos de judicialização por uma contratação indevida ou de uma cobrança por falta de informações no momento da contratação, gerando prejuízos no momento do acionamento do seguro e na negativa pela seguradora por risco excluído ou não contratado, assim como na indicação equivocada da empresa garantidora do seguro, com base na jurisprudência e especialmente na aplicação do Código de Defesa do Consumidor, pois, mais do que conhecimento jurídico e processual, necessária a adequação dos profissionais de direito a essa realidade digital que vivenciamos.

____________________________________

[1] Faculta a utilização da assinatura digital, nos documentos eletrônicos relativos às operações de seguros, de capitalização e de previdência complementar aberta, por meio de certificados digitais emitidos no âmbito da Infra-estrutura de Chaves Públicas (ICP-Brasil), e dá outras providências.
https://www2.susep.gov.br/safe/scripts/bnweb/bnmapi.exe?router=upload/5229

[2] Dispõe sobre a utilização de meios remotos nas operações relacionadas a planos de seguro e de previdência complementar aberta.

https://www2.susep.gov.br/safe/scripts/bnweb/bnmapi.exe?router=upload/11355

[3] Dispõe sobre a utilização de meios remotos nas operações de seguro, previdência complementar aberta e capitalização.

https://www2.susep.gov.br/safe/scripts/bnweb/bnmapi.exe?router=upload/24962

[4] Dispõe sobre a aceitação e a vigência do seguro e sobre a emissão e os elementos mínimos dos documentos contratuais.

https://www2.susep.gov.br/safe/scripts/bnweb/bnmapi.exe?router=upload/25330

[5] https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2166831