Em abril de 2022, a Superintendência de Seguros Privados – SUSEP editou normas a respeito do produto “seguro de garantia estendida”, revogando resoluções anteriores e estabelecendo regras e diretrizes a serem observadas pelo mercado (Resolução CNSP nº 436/2022[1] e Circular SUSEP nº 659/2022[2]).
Este seguro tem por objetivo fornecer ao segurado, de forma facultativa e mediante o pagamento de prêmio, a extensão temporal da garantia original do fabricante/fornecedor de um bem adquirido e, quando prevista, sua complementação.
Não se trata de um produto novo, pelo contrário, está presente há mais de 15 anos[3], inicialmente como um serviço e depois como um seguro, ganhando cada vez mais importância nas vendas de varejo, especialmente nos casos de parcelamento do valor do bem em que o período da garantia original de fábrica é inferior ao tempo das prestações a serem pagas.
Porém, apesar de não ser nenhuma novidade, muitos consumidores ainda possuem dúvidas sobre a sua natureza (se é um seguro) e sua função (garantia de um produto novo, mas com vigência apenas com o término da garantia original), gerando insatisfação e confusão pela falta de informações no momento da venda ou do que está descrito na apólice.
Quanto ao primeiro questionamento, a garantia estendida possui os cinco elementos básicos do seguro: risco, segurado, segurador, prêmio e indenização[4]. O fato de que a vigência inicial fica postergada ao término da garantia do fabricante não desnatura o fato de que o risco é plenamente segurável, sendo, portanto, possível, futuro, incerto, mensurável e independente da vontade das partes.
Quanto ao segundo questionamento, conforme artigo 7º, da Resolução CNSP nº 436/2022, este seguro deve oferecer, obrigatoriamente, uma das seguintes opções de cobertura: extensão de garantia original (mesmas coberturas e exclusões oferecidas pela garantia do fornecedor), extensão de garantia original ampliada (inclusão de novas coberturas) e extensão de garantia reduzida (redução das coberturas originais). Facultativamente, pode ser oferecida uma “complementação de garantia” com vigência simultânea ao do fabricante, contemplando situações não abrangidas ou excluídas na garantia original (art. 8º).
Importante deixar bastante claro que, com exceção da cobertura de “complementação de garantia”, que, repita-se, é um opcional nesse tipo de seguro, e não uma cobertura obrigatória, o início de vigência do contrato e o início de vigência da cobertura são distintas, visto que este último apenas começa com o término da garantia do fornecedor, e não da contratação do seguro (art. 8º, Circular SUSEP nº 659/2022), sendo vedada a sua renovação automática (art. 9º, parágrafo único).
Além disso, quanto à contratação, a comercialização do seguro não pode estar atrelada a descontos e nem estar embutida no valor da compra (art. 6º), visando a coibição da venda casada.
Outro detalhe que diferencia a garantia estendida é que se permite prever franquia
e/ou participação obrigatória do segurado somente para coberturas diferentes daquelas
oferecidas na garantia do fornecedor (art. 17).
Diante dessas características e regramentos do seguro, observa-se que não é uma garantia original do produto e não se confunde com a responsabilidade do fabricante, tratando-se de um outro contrato, com outra origem, pactuado entre seguradora e segurado para garantir a extensão temporal da garantia do fornecedor de um bem adquirido e, quando prevista, sua complementação.
A responsabilidade do fabricante é legal e a responsabilidade da seguradora é contratual, sendo que a seguradora somente responde pelos riscos expressos na apólice, podendo ser iguais, ampliadas ou reduzidas comparadas àquelas previstas na garantia do fabricante.
Porém, de onde surge a insatisfação dos consumidores? Além das situações conhecidas de dificuldade no acionamento do seguro, qualidade no atendimento pela assistência técnica e tempo para resolução do problema, há também a questão de que alguns vendedores não fornecem informação prévia adequada sobre a contratação do seguro no momento da compra do produto, seja por desconhecimento ou falta de treinamento ou mesmo por questões de atingimento de metas, fazendo com que o consumidor, por vezes, desconheça a sua contratação ou as coberturas/exclusões previstas no seguro.
Outro ponto é quando o vício ou o defeito no produto decorre de problema de fabricação, mas a reclamação se deu após o término da garantia original e, quando isso de fato ocorreu, não se aplicaria a garantia estendida porque o defeito deveria ter sido solucionado dentro da garantia original, mas muitas vezes o consumidor também não será atendido pelo fabricante porque a garantia teria expirado.
Nesse ponto, importante deixar claro que apresentando o defeito no produto dentro do prazo da garantia estendida, tem direito o consumidor a acionar a assistência técnica e obter a solução do problema junto a seguradora, ocorrendo antes, a responsabilidade é do fabricante, não havendo que se falar em responsabilidade solidária por pertencer a mesma cadeia de consumo.
Nós, da Carvalho Nishida, sabemos da importância da transparência nas contratações, clareza nos termos da apólice de seguro e boas práticas, primeiro, porque o consumidor precisa ser prévia e adequadamente informado sobre o que está contratando, tendo em vista a necessidade de observância de uma postura ética e responsável no setor de seguros, segundo, porque falhas no fornecimento de informações sobre a garantia estendida, sejam elas por omissões ou utilização de termos e expressões confusas e ambíguas, implicam em insatisfação dos consumidores, aumento de reclamações e demandas judiciais, comprometendo, assim, o desenvolvimento sustentável desse tipo de produto.
________________________
[1] https://www2.susep.gov.br/safe/scripts/bnweb/bnmapi.exe?router=upload/25868
[2] https://www2.susep.gov.br/safe/scripts/bnweb/bnmapi.exe?router=upload/25873
[3] https://www2.susep.gov.br/safe/scripts/bnweb/bnmapi.exe?router=upload/5571
[4] http://www.susep.gov.br/menu/informacoes-ao-publico/planos-e-produtos/seguros/seguro-de-garantia-estendida-1