Sempre que pensamos nas obrigações de fazer e não fazer a primeira preocupação que nos ocorre é a incidência de multa, as conhecidas astreintes, que embora tenham gênese no caráter de desestimular o descumprimento de uma obrigação específica, ao longo dos últimos vinte anos têm estrelado os palcos da jurisprudência com questões tormentosas envolvendo enriquecimento sem causa à vista das vultosas quantias arbitradas e executadas, não raras vezes, inclusive, quando houve o cumprimento substitutivo ou mesmo específico, ficando a decisão à mercê da casuística afeta à interpretação de cada caso.

No entanto, muitas vezes nos negócios jurídicos envolvendo muitos dos ramos do contrato de seguro, a obrigação específica é de impossível realização quando a questão se judicializa, pelas mais diferentes razões, momento em que entra em cena a conversão da obrigação de fazer em perdas e danos, lugar em que também mora um grande perigo.

Isso porque, a conversão da obrigação de fazer em perdas e danos no âmbito do direito brasileiro, consiste em reparar àquele que não pode mais ter a obrigação cumprida de maneira específica, no recebimento em pecúnia e aí os valores podem ser astronômicos a depender da obrigação “pano de fundo”, como por exemplo, no seguro prestamista, uma obrigação de quitar um financiamento se tornar a obrigação de pagar ao segurado valor de mercado de um imóvel, ou mesmo, numa obrigação de exibição de apólice, as perdas e danos serem equiparadas ao pagamento do capital segurado para uma determinada cobertura.

Nesse momento, a Seguradora certamente poderá ser pega de surpresa em relação a uma provisão não constituída, o que implica em grande problema regulatório, porque em um primeiro momento provisionara levando em considerações parâmetros outros a se pensar que o objeto daquela ação era um ‘fazer’, muitas vezes, subestimado por falta de diretrizes práticas concretas para o caso.

Há uma semana aproximadamente, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial 212.365- MG, da relatoria da Ministra Regina Helena Costa, colocou o tema em pauta.

O REsp 212365 envolveu a discussão sobre a conversão de uma obrigação de fazer em perdas e danos.  In casu, o Superior Tribunal de Justiça analisou a possibilidade de transformar uma obrigação de fazer (como o cumprimento de um contrato) em perdas e danos (compensação financeira) quando a parte não cumprir a obrigação no tempo devido, afirmando o entendimento de que, em algumas situações, quando a obrigação de fazer não é cumprida, a parte prejudicada pode optar pela conversão dessa obrigação em perdas e danos. Isso ocorre especialmente quando a execução da obrigação é impossível ou excessivamente onerosa para a parte obrigada.

Até aqui, nenhuma novidade.

No entanto, o STJ veio reafirmar o entendimento segundo o qual a conversão da obrigação de fazer em perdas e danos ocorrerá independentemente do pedido do titular do direito subjetivo, em qualquer fase processual, quando verificada a impossibilidade de cumprimento da tutela específica.

E mais, sempre que a mora do devedor torne inviável a concessão da tutela específica pleiteada na inicial, poderá a obrigação ser convertida em reparação por perdas e danos, não configurando, automaticamente, carência superveniente do interesse processual.

E aqui é que se deve entrar a atenção redobrada da parte contratada, a Seguradora.

Nos contratos de seguros, em que são frequentes as obrigações de fazer, necessário que se tenha atenção a esse ponto e não apenas ao risco de multa, mas também ao risco de uma conversão em perdas e danos, para que um problema não se torne outro ainda maior.

A decisão do STJ tem impacto direto no mercado segurador, uma vez que muitas apólices de seguro envolvem obrigações de fazer (como o fornecimento de serviços médicos, reparos, indenizações, entre outros). O entendimento de conversão de obrigação de fazer em perdas e danos afeta as cláusulas de cumprimento de contratos e as expectativas de indenização por parte do segurado.

À vista do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, reflexos importantes para o setor segurador podem incluem:

– Responsabilidade Civil: Seguradoras podem ser desafiadas em relação ao cumprimento das suas obrigações contratuais, especialmente em casos em que a obrigação de fazer (como o reparo de um bem danificado ou o atendimento médico) não for realizada conforme o contrato. O segurado, neste caso, pode exigir não apenas o cumprimento, mas uma compensação financeira pelos danos causados pela inexecução.

– Atrasos e descumprimento: Em situações em que há atrasos no cumprimento de um serviço ou no pagamento de uma indenização (como o caso de seguros de vida, saúde, ou danos materiais), as seguradoras podem ser responsabilizadas pela conversão da obrigação em perdas e danos, com implicações financeiras ainda maiores.

– Cláusulas Contratuais: As seguradoras precisarão revisar suas cláusulas contratuais para minimizar a brechas em que haja possibilidade de conversão das obrigações de fazer em perdas e danos, especialmente nos contratos em que se comprometam a fornecer serviços ou bens.

– Previsibilidade de Indenizações: A decisão do STJ aumenta a previsibilidade de que, em caso de não cumprimento de uma obrigação contratual, a parte afetada poderá buscar não só o cumprimento, mas uma compensação financeira equivalente ao prejuízo. As seguradoras precisarão ajustar seus modelos de cálculo de riscos e provisionamento para essas eventualidades.

O REsp 212365 do STJ reforçou o entendimento de que a obrigação de fazer pode ser convertida em perdas e danos quando o cumprimento não for possível ou for excessivamente oneroso e isso pode acontecer sem que tenha havido pedido expresso nesse sentido na inicial. Para o mercado segurador, isso implica em maior responsabilidade sobre o cumprimento dos contratos e indicação de revisitar seus clausulados, para evitar que o não cumprimento gere consequências financeiras mais graves do que aquelas inicialmente previstas.

O aumento da responsabilidade das seguradoras, derivado dessa interpretação, pode levar a um aumento das disputas contratuais e influenciar a forma como as apólices são estruturadas e avaliadas.

Nós, da Carvalho Nishida, estamos por aqui para auxiliá-los nesse tema e em outros tantos que afetam a rotina operacional das Seguradoras e em sua interface no contencioso e consultivo preventivo.